Caio transforma a FENIT num Grande Palco!

“É preciso estar preparado para tumultuosas e intermináveis ondas de transformação.” Elizabeth Gilbert

Candidatas Rainha do Algodão 1959
Queridos leitores, Caio resolveu repetir nessa II FENIT, as atrações que fizeram sucesso na primeira edição da Feira como o Concurso Rainha do Algodão, que continuaria com o apoio das Industrias Têxteis Matarazzo-Boussac e Votorantim, o desfile do Concurso Miss Brasil, e o desfile dos costureiros internacionais que nesse ano teria como grande destaque a presença do famosíssimo costureiro Pierre Cardin. E a grande novidade ficaria por conta da atração musical, que segundo o próprio Caio, iria deixar o publico de joelhos: a apresentação de Luís Peixoto, cantor e compositor que arrastava multidões para assistirem seus shows.

Com relação à Feira Têxtil em si, Caio preparou duas megas novidades. A primeira, seria o desfile de moda da Rhodia sob o comando de Lívio Rangan, com a clara missão de divulgar o fio sintético e a segunda, o desfile do costureiro brasileiro Dener, com a incumbência de fazer o lançamento oficial da Moda Brasileira.

Como acontece em todo casamento bem-sucedido, a parceria do Caio com o Lívio já no primeiro mês ambos estabeleceram as regras desse relacionamento. Embora, jamais tenham sido verbalizadas, elas simplesmente aconteceram, foram sacramentadas e respeitadas. Um fio invisível marcou os limites da atuação de cada um e os seus respectivos papeis não demoraram muito para se tornarem claros. Não houve dúvidas de quem mandava no que, quais os sonhos que pertenciam a quem, onde cada um queria chegar, e por fim e não por último, ambos sabiam quais os passos que precisavam ser dados para se chegar onde queriam.

O que ocorreu entre os dois foi a explosão de uma imensa e fraterna amizade, que evoluiu para uma parceria perfeita, conservada num frasco precioso, embebida numa fórmula química de mútua sabedoria. Por parte do Lívio, ele rapidamente reconheceu que o Caio era o dono da FENIT, e um importante empresário brasileiro que conhecia muito bem como o Brasil funcionava, quem eram os brasileiros, e acima de tudo era quem tinha livre trânsito com a maioria das indústrias existentes no Brasil, era quem conhecia todos os governos e governantes, e quem, numa ditadura que o Brasil vivia, sabia na prática o que podia e o que não podia ser feito, que o Caio era dono da única empresa Promotora de Feiras do Brasil, e que o Pavilhão do Ibirapuera era “só dele”.

Lívio entendeu que o “segredo de ouro” para ganhar o respeito e a confiança desse senhor empresário todo poderoso, era aceitar que ele precisava da sua autorização para fazer na FENIT, seja lá o que ele precisasse ou quisesse fazer. E isso, diga-se de passagem, nunca foi um problema para o Lívio, e sim sua grande sabedoria. Por parte do Caio, quando ele bateu os olhos nesse italiano bem vestido, discreto, excepcionalmente inteligente, possuidor de uma criatividade que exalava por todos os poros, leal, correto, e com um talento extraordinário para juntar moda, beleza, música, e todas as artes, soube naquele exato instante, que o Lívio se tratava de uma jóia rara, e que era a única pessoa capaz de ajudá-lo a catapultar a sua FENIT ao pódio de maior Feira da Industria Têxtil da América Latina.

Ambos concordaram que o desafio tanto da Fenit quanto o da Rhodia não estava só em criar uma Moda Brasileira, mas sim em valorizar tudo o que fosse brasileiro, tudo o que fosse nacional. “E depois de mais a mais Lívio”, falou Caio emocionado, “foi com esse objetivo que eu criei a própria FENIT”. Se os sentimentos dos dois pudessem se materializar nesse momento, fogos de artifícios começariam a brilhar na sala. Caio tossiu, para disfarçar a emoção, por que até aqui, ele tinha chegado sozinho arrastando suas ideias, julgado por todos como louco, e pela primeira vez encontrava alguém que pensava e queria fazer as coisas exatamente como ele sempre quis fazer. Essa sensação de ter um cúmplice era muito nova, e ele teve que admitir que era uma experiência sem dúvida, docemente reconfortante.

Com a certeza de estarem sentindo a mesma alegria que Colombo sentiu quando descobriu a América, Caio e Lívio saíram para comemorar a descoberta de como deveriam ser os desfiles e a parceria em si. Anotaram orgulhosos finalmente a fórmula da descoberta de como colocar “o ovo em pé”: A FENIT e a Rhodia iriam criar uma Moda 100% Brasileira, democrática, confeccionada com o Fio Sintético que seria a estrela do show, para poder baratear o custo da roupa. E a FENIT e a Rhodia fariam a mulher brasileira se orgulhar dos tecidos nacionais assim como a francesa e a italiana se orgulham dos delas.

“Lívio, o que ainda temos por aqui?”, perguntou Caio ansioso com a quantidade de papel que ele ainda precisava dar uma olhada, enquanto passava os olhos por tudo aquilo. Quando Lívio chegou na Alcantara já passava das 17 horas, com uma quantidade de papel que Caio brincando lhe disse que só faltava a conta da padaria. Lívio lhe mostrou um nome: Alceu Penna. “Veja Caio, eu acredito que para podermos criar uma Moda Brasileira, é necessário que os modelos das roupas sejam concebidos por estilistas brasileiros”. “Claro Lívio, você não poderia ter pensado numa pessoa melhor”. Alceu Penna, desde 1938, tinha uma seção de ilustrações na revista O Cruzeiro, intitulada “As Garotas”, por sinal de muito sucesso, uma referencia de moda para o publico feminino. Alceu também foi responsável pelos figurinos da Carmem Miranda, pelo aprimoramento dos seus turbantes, nos quais ela carregava uma verdadeira salada de frutas, pelas suas saias rodadas multicoloridas e pelas suas sandálias de salto alto e solas grossas.

Depois que o Caio terminou de olhar os papeis, decidiram batizar o desfile-show com o nome de “Brazilian Nature” e as roupas de “Linha Café”. A concepção dos modelos seria entregue a Alceu Penna, o cenário ao cenógrafo Cyro del Nero. Seria a primeira vez no Brasil que um desfile de moda teria um cenário e um tema. Para Caio e Lívio como já tinham decidido que o desfile como um todo tinha que expressar a “Brasilidade”, para isso a Coleção teria que ter as cores das sementes, flores, folhas e frutos do café, os tons teriam que ser verdes vegetal e marrom. E por fim os tecidos seriam estampados com cestos, peneiras e moendas estilizadas, desenhadas por pintores brasileiros.” “Imagino”, completou Caio “que toda Coleção deva ser chamada de “Coleção Rhodia”, para que esse nome seja sinônimo de “Moda Brasileira”.

Para esse primeiro desfile, Lívio conseguiu 10 manequins emprestados da Socila. O desfile-show teria como destino um estrondoso sucesso e Lívio contrataria Alceu Penna definitivamente para desenhar os modelos para todas as Coleções da Rhodia, numa parceria que iria durar até 1970. Mesmo a Rhodia concedendo liberdade total de gastos ao Lívio para esse desfile e para os outros que ele viesse a realizar, Caio quando tomou conhecimento do tamanho da conta, chamou o seu amigo de lado e sugeriu que ele fosse em busca de outros patrocinadores. Com uma carta de apresentação do Caio, Lívio conseguiu o patrocínio da Varig, e Lívio como já conhecia o pessoal da Manchete, conseguiu que a revista também fosse uma das patrocinadoras. Caio suspirou aliviado, porque ele conhecia muito bem as empresas e conhecia muito bem o Lívio e sabia que os gastos com esses desfiles seriam siderais.

Junto com sua equipe, Caio tomou todos os cuidados, dos mínimos aos maiores para garantir o sucesso dessa II FENIT: os seguranças foram contratados entre os policiais da Polícia de São Paulo, a Alcantara conseguiu que um numero bastante razoável de contingentes do Corpo de Bombeiros permanecesse no Pavilhão durante os 15 dias de Feira, foi pedido ao Serviço de Trânsito que enviasse guardas para coordenar o trânsito naquela região, e Caio pediu pessoalmente ao Prefeito para aumentar durante o período da FENIT, o numero de fiscais do Ibirapuera. Foram contratadas 300 recepcionistas, foi instalado um ótimo sistema de autofalantes, e um exército de 100 faxineiras trabalhou os três turnos, manhã, tarde e noite com a incumbência de manter os banheiros imaculados, os corredores acarpetados impecavelmente limpos, e todo o Pavilhão reluzente durante a Feira. Caio pediu licença para a Prefeitura para fazer um estacionamento VIP dentro do Parque, para receber somente os carros das autoridades. Deu ordens expressas para ninguém usar esse estacionamento sem a apresentação da credencial, “nem que se tratasse do seu pai ou irmão”.

No dia da inauguração, quando o motorista entrou no estacionamento, Caio se deu conta que ele não tinha a tal credencial, ninguém lembrou que ele iria precisar de uma. Não adiantou o motorista assegurar para o encarregado do estacionamento que quem estava no carro era o Dr. Caio, que o rapaz muito seguro e decidido a cumprir à risca a determinação do seu chefe, reagiu: “Se esse senhor sem credencial é o Dr. Caio, então eu sou o Jânio Quadros. Foi preciso o motorista deixar o Caio na porta do Pavilhão e estacionar o carro fora do Parque. Quando terminou a FENIT, Caio mandou chamar o rapaz, que entrou apavorado na sua sala, Caio então falou: “Parabéns, você está promovido. Mas nunca se esqueça: eu sou o Dr. Caio e você não é o Jânio Quadros”.

Depois de muitos abraços e exausto de receber milhões de parabéns, Caio foi embora como se estivesse sendo carregado por uma nuvem, de tão feliz que estava se sentindo. Encontrou o Lívio na saída, os dois se enlaçaram num forte abraço, o desfile da Rhodia tinha tido um sucesso estrondoso. Só os dois sabiam o significado daquele abraço.

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