Feira Das Américas - Os Pingos Nos Is

Por Rui Carvalho

FEIRA DAS AMÉRICAS – OS PINGOS NOS Is

Os anos passam, o mundo gira, mas há ranços que insistem em ficar. Mesmo ultrapassadas pelo desfiar incessante de novas tendências, ou desmentidas pelos fatos, há “verdades” que, a despeito de não passarem de versões, fincaram raízes nessa espécie de inconsciente coletivo a que chamamos “trade”. É preciso, porém, saber distinguir fatos de mitos, e estes das simples versões.  

Rui Carvalho
A necessidade de participação nas grandes feiras de turismo é um desses fatos/mitos/versões que sempre dão o que falar e alimentam as rodas de conversa onde quer que haja dois profissionais de turismo. Já participei de mais de duas dezenas de “Abavs” – a agora chamada Feira das Américas – e ouvi outras tantas dezenas de teorias a respeito de sua eficiência ou inutilidade como ferramenta de negócios. Mas vamos lá: afinal o que são negócios no turismo? Aliás, a que tipo de turismo nos referimos ao dizer que as feiras geram (ou não geram) negócios da ordem dos milhões? Sabemos que nossos números sofrem de labirintite crônica, pois a razão da sua grandeza depende muito de quem os proclama e, mais ainda, da importância do interlocutor. Mas, para efeitos de análise de participação em feiras, vamos concentrar-nos, neste texto, no chamado Marketing de Destinos. Há quem defenda que os Convention & Visitors Bureaux não devam participar de eventos como a Feira das Américas, ou o Festival de Turismo de Gramado (apenas para citar dois dos mais conhecidos). Alegam seus detratores que tais eventos servem apenas para “oba-oba”! Pode até ser que quem assim pensa esteja coberto de razão, mas eu pergunto: se a captação de eventos, assim como as ações de mercado para aumento do fluxo de visitantes, dependem da qualidade e abrangência da nossa rede de relacionamento (e disso ninguém duvida), que ferramenta seria mais adequada que o tal “oba-oba”? Parte da resposta pode estar em outra pergunta: afinal o que é oba-oba? O perambular ininterrupto pelos estandes de companhias aéreas, redes hoteleiras e operadoras em busca de oportunidades de contatos e negócios não deveria ser o objetivo principal de qualquer executivo de CVB interessado em ampliar sua rede de relacionamento e, através dela, promover o seu destino? Na moral? É isso mesmo que fazemos, embora, por vezes, tenhamos que driblar a desconfiança de alguns dirigentes que ainda não compreendem o valor do “oba-oba” para o nosso negócio. Alguns executivos, com receio de defender esta postura e desagradar suas diretorias, preferem disfarçar os festivos contatos sociais sob o manto de sérias negociações que raramente acontecem! Convenhamos, feira de turismo não é lugar para negociar coisa alguma, não é ambiente para conversas sérias (ressalvadas as devidas exceções, como as reuniões reservadas que acontecem nas áreas privativas dos estandes). Feira de turismo é lugar de consolidar, reforçar, manter e ampliar as relações com nossos clientes e fornecedores, para que consigamos alcançar os objetivos traçados nos nossos planos de captação e promoção. Ir jantar com um diretor de companhia aérea, almoçar com o gerente de uma grande operadora, ou bater um papo descontraído com o executivo de uma rede hoteleira, é obrigação de qualquer um que dependa de relacionamento para realizar negócios e alcançar metas, ou seja: todos nós.  É esse o “oba-oba” que precisamos desmistificar e defender sem meias palavras. O nome do nosso negócio não é turismo, é RELACIONAMENTO. Assim, aquele chopinho no Bar Brahma no final da feira pode trazer mais resultados do que uma enfadonha reunião, a distribuição de milhares de folhetos no estande, ou a (muitas vezes) inútil troca de cartões de visita. A verdade é que as grandes feiras de turismo estão mais para encontros de fornecedores do que para canal de distribuição de produtos para agentes de viagens! 

Quem participou como expositor da Feira das Américas encerrada no domingo dia 08/09 sabe do que estou falando. De cada dez pessoas que me abordaram no estande, sete queriam vender-me alguma coisa, e não comprar o meu produto. Essa nova (?) tendência é tão evidente que até as relações dos destinos com as operadoras mudaram radicalmente. Na reunião que mantive com uma das grandes operadoras brasileiras, cuja pauta deveria ser analisar de que maneira eles poderiam melhorar as vendas para Foz do Iguaçu, percebi que, na verdade, a operadora estava mais interessada em vender-me espaço publicitário em suas variadas mídias: vitrines das lojas, site, redes sociais, revista interna, newsletter e por aí vai, do que em vender meu produto! As grandes operadoras, cientes da força que têm como canal de distribuição, passaram a comportar-se como veículos de mídia e não mais como vendedoras do destino. É claro que ao anunciarmos nas mídias propostas acabamos por alavancar as vendas, mas que soa um pouco esquisito para quem está há mais de três décadas nesse mercado, lá isso soa! O modelo de negócio mudou, e precisamos acompanhar e entender essa mudança. O “oba-oba” faz parte do nosso dia a dia e é melhor que saibamos explorá-lo a nosso favor. Este é um dos mitos que precisamos derrubar. É preciso acabar com os eufemismos e chamar as coisas pelo nome. Eu faço questão de ir para os grandes eventos praticar o bom, velho e eficiente “oba-oba”! Não tenho do que me queixar, é mais produtivo do que desperdiçar folhetos com clientes que nem se interessam pelo meu produto!

Este ano participei da Feira das Américas no estande de Foz do Iguaçu. Como executivo do CVB local tinha alguns contatos a fazer. Ao longo de quatro dias mantive conversas com duas dezenas de fornecedores e posso dizer: foi muito proveitoso. Consegui, em quatro dias, falar com pessoas que demoraria meses a encontrar pelas vias normais do agendamento de reuniões. Perambular de estande em estande atrás de falar com quem te interessa ainda é o melhor resultado que se pode esperar de um evento como esse. Precisamos repensar a produção e distribuição dos caros materiais que, invariavelmente, acabam no lixo dos arredores dos pavilhões. Se é para jogar dinheiro fora, então há formas mais práticas e inteligentes. É urgente que nosso mercado adira aos materiais digitais e acabe com as toneladas de papel que custam fortunas. Os agentes de viagens realmente interessados nos nossos produtos não fazem mais nem menos negócios por influência de nosso material gráfico. Os estrangeiros, então, não entendem porque ainda investimos pequenas fortunas nesse tipo de divulgação. Um destino precisa ter um site completo e interativo, e mídias digitais fáceis de distribuir. Precisa saber usar as redes sociais e ser capaz de prover informação de qualidade na velocidade da era digital. Simples assim (ou nem tanto!). No mais, nada é mais efetivo para gerar negócios do que o bom e velho corpo a corpo, o bate papo com fornecedores, concorrentes e amigos, ou seja, o tal “oba-oba” que muitos criticam! Foi o que fiz este ano, e com excelentes resultados. Tenho certeza que Foz do Iguaçu vai continuar a ser um destino preferencial para a maioria dos (bons) operadores, e minha peregrinação pelos estandes da Feira das Américas, por certo, vai ajudar a alavancar o fluxo, a sedimentar relações de confiança, a esclarecer dúvidas, desobstruir gargalos e construir canais de diálogo que, inevitavelmente, levarão à realização de mais e melhores negócios. E já que o tema foi o “oba-oba”, que tal brindarmos a isso?