Gestão de Riscos, Controle de Acesso e Revista Pessoal em Eventos

Segurança em eventos não é detalhe: é a espinha dorsal que sustenta toda a operação. Revista não é busca; controle de acesso não é constrangimento. Cada decisão, da barreira física à comunicação com o público, impacta vidas. Improviso gera vulnerabilidades, planejamento salva. Eventos seguros são construídos com ciência, estratégia e compromisso.

Segurança é Mais que um Procedimento, é um Compromisso.

Planejar e gerir um evento vai muito além de montar estruturas, vender ingressos ou alinhar logística. Trata-se de lidar com um ambiente onde milhares de pessoas, fluxos intensos e instalações temporárias se cruzam em um mesmo espaço — e nesse cenário, improvisar não é opção.

A gestão de riscos em eventos, independentemente da complexidade ou magnitude, deve ser vista como um compromisso com a vida e a integridade das pessoas. Mais do que uma exigência operacional, é a base que sustenta a credibilidade da indústria do entretenimento e do turismo.

Trata-se de um processo contínuo, que orienta desde o planejamento estratégico até a cooperação entre agências e o uso de tecnologias avançadas para antecipar vulnerabilidades e mitigar impactos.

A relevância do tema é tamanha que já conta com diretrizes internacionais consolidadas, como a ISO 31000:2018, referência global em gestão de riscos e aplicada em diferentes setores para reforçar um princípio simples e poderoso: segurança não se improvisa, se planeja.

Gestão de Riscos: da Teoria à Prática

Eventos de qualquer complexidade ou magnitude, concentram milhares de pessoas, estruturas temporárias e fluxos intensos. Por isso, demandam planejamento meticuloso.

Normas como a ISO 31000:2018 (gestão de riscos) e a NBR 16004:2023 (planos de emergência) são guias indispensáveis. No Brasil, a legislação avançou e hoje impõe responsabilidades claras:

• Lei nº 14.967/2024 (Estatuto da Segurança Privada): atribuições exclusivas ao vigilante credenciado e a contratação de um Gestor de Segurança;

• Lei Geral do Esporte (Lei nº 14.597/2023): obriga medidas preventivas pelos organizadores;

• Estatuto do Torcedor (Lei nº 10.671/2003): garante direitos e segurança ao público.

A mensagem é direta: onde vidas estão em jogo, não há espaço para improviso.

Revista Pessoal x Busca Pessoal: Entenda a Diferença

Na entrada de um evento, algumas práticas são frequentemente equivocadas e acabam comprometendo a segurança e a legalidade do processo.

A primeira delas diz respeito ao local e à forma da revista.

O correto é que a revista seja realizada antes do acesso principal, no lado externo ao evento. Isso porque, se o frequentador estiver portando um objeto proibido, ele deve ser impedido de entrar no limite da portaria, e não já dentro do espaço.

Permitir que essa triagem ocorra dentro do espaço do evento, como infelizmente ainda acontece em muitos casos Brasil afora, é um erro grave: quem não deveria ingressar já estará no interior do equipamento, aumentando riscos, sobrecarregando as equipes e fragilizando todo o planejamento de segurança.

Cito aqui minha própria experiência como gestor de segurança no Maracanã, durante competições nacionais e internacionais. Adotar a revista no limite externo da portaria foi sempre uma decisão estratégica e operacional afim de proteger o perímetro interno e reduzir drasticamente a possibilidade de objetos ou pessoas proibidas de circularem dentro do estádio. Essa prática, baseada em protocolos internacionais, mostrou-se mais eficaz, eficiente e preventiva, além de legitimar o processo de controle de acesso diante das autoridades e do público.

Em resumo: a revista deve ser feita antes do ingresso, nunca depois dele. É nesse detalhe — muitas vezes negligenciado — que se decide se a segurança será preventiva ou apenas reativa.

A segunda confusão recorrente é a diferença entre revista pessoal e busca pessoal:

• Revista pessoal: ato preventivo e administrativo, realizado por vigilantes credenciados, com o objetivo de impedir a entrada de armas, drogas ou objetos que coloquem em risco a segurança coletiva.

• Busca pessoal: ato investigativo de polícia, regulado pelo art. 244 do Código de Processo Penal, restrito à autoridade policial e realizado somente diante de fundada suspeita de crime.

Quando profissionais não habilitados confundem essas práticas, não apenas violam direitos fundamentais, como também colocam em xeque a legalidade da operação e a credibilidade do evento.

Revista é prevenção; busca é investigação. Misturar as duas é abrir espaço para riscos e nulidades jurídicas.

Controle de Acesso: Mais do que Conferir Ingressos. Controle de acesso também se divide em duas dimensões:

• Atividade administrativa: checar credenciais, ingressos ou QR Codes. Pode ser feita por recepcionistas ou controladores de público.

• Atividade securitária: impedir o ingresso por risco, recusa de revista ou porte de objeto proibidos, a exigência é de vigilante credenciado.

Se essa distinção é ignorada, a prática se transforma em constrangimento ilegal (art. 146 do Código Penal); ou seja: quem não é autorizado não pode barrar.

Comunicação e Barreiras: Os Pilares da Segurança

Sempre digo: "A segurança começa com comunicação e informação, sem informação clara, a equipe se perde. Sem comunicação com o público, o evento se fragiliza.

Um plano de risco eficaz exige três pilares:

1.Comunicação interna eficiente entre produção, segurança privada e órgãos públicos;

2.Comunicação externa clara e acessível ao público, com áudio, sinalização visual e informação em tempo real;

3.Barreiras físicas e perimetrais estruturadas, que organizem fluxos e permitam respostas rápidas a crises — conforme as melhores práticas internacionais, como o Purple Guide (Reino Unido).

Quando a comunicação falha, a segurança desmorona.

A Segurança em eventos não é detalhe: é a espinha dorsal que sustenta cada momento, do primeiro ingresso vendido ao último minuto do show. O simples ato de barrar alguém na entrada pode parecer trivial, mas na verdade é um ato jurídico e estratégico, com impacto direto na integridade do público, na imagem do organizador e até na continuidade do próprio evento. A gestão de riscos precisa ser encarada como uma disciplina interdisciplinar, que une direito, sociologia, criminologia e gestão estratégica, conduzida por profissionais habilitados, treinados e reconhecidos.

No fim, a equação é clara e inegociável; O planejamento estratégico e operacional salvam vidas, por outro lado, a maneira que alguns eventos são cuidados na base do improviso gera vulnerabilidades.

E é nesse equilíbrio — entre ciência, prática e respeito à lei — que a indústria de eventos encontra sua verdadeira legitimidade.

Acima de tudo, confiança é um pilar estruturante.