CUIDADO: A ESPERANÇA É IRMÃ DA DECEPÇÃO

Por Rui Carvalho

A ESPERANÇA É IRMÃ DA DECEPÇÃO!

Rui Carvalho
Como todos sabem os grandes eventos esportivos vêm aí. Como todos também sabem, o Brasil está há muito tempo patinando no número de turistas estrangeiros que recebe, e a esperança de sair desse atoleiro está, justamente, nos grandes eventos esportivos que se avizinham. Mas será que há razões concretas para alimentar essa esperança? O que temos feito de efetivo para merecer a atenção do turista estrangeiro? Arrancar-lhe os olhos com os preços escorchantes de nossos serviços? Ou testar sua paciência com a falta de profissionalismo do atendimento? Assim como não é possível fazer omelete sem ovos, tampouco se progride no Turismo sem mão de obra de qualidade. Mas como obter qualidade de profissionais saídos de cursos medíocres, recebendo lições de professores sem formação (e não me refiro a títulos ou diplomas, mas a formação básica de qualidade), e treinados por um mercado cada vez mais mercantilista e volátil? Pois é, a conta não fecha. Some-se a isso o fato de que, nos últimos anos, não pudemos contar com a atuação dos EBTs – Escritórios Brasileiros de Turismo, por conta das inúmeras trapalhadas ocorridas no ambiente sombrio da política de Brasília. Agora, finalmente, a EMBRATUR anuncia a reativação dos EBTs. Duas empresas, uma de São Paulo e outra de origem portuguesa, foram as ganhadoras da licitação para a administração dos Escritórios. Os executivos já estão contratados e devem iniciar o trabalho em breve nos mercados para os quais foram designados. Desejo-lhes sorte, mas receio que irão precisar muito mais que isso. Vamos aguardar a divulgação dos currículos e dos projetos que irão apresentar para resgatar, ao menos em parte, o tempo perdido. Entretanto, se tomarmos como exemplo o que vem ocorrendo na EMBRATUR e no MINISTÉRIO nos últimos anos, onde interesses políticos e o, digamos, apadrinhamento geográfico têm contribuído muito para desconstruir as conquistas da era Walfrido, não será surpresa se constatarmos que a opção se fez novamente por brilhantes intelectuais ou teóricos contumazes, sem nenhum serviço relevante prestado ao Marketing de Destinos ou à Promoção Comercial! Espero estar enganado, mas o cenário exige prudência. Como diz o cego: veremos...

O fato é que, em que pese a crise que tem devorado o poder de compra dos europeus, não é possível abandonar aqueles mercados sem correr o risco de transformar o trabalho de anos em terra arrasada. As crises na Europa, ao contrário da brasileira, costumam ser passageiras, ou seja, crises, e não o reflexo permanente da falta de alicerces sustentáveis, como parece ser o nosso caso. Mesmo em países teoricamente empobrecidos, como Portugal ou Espanha, onde a massa de desempregados é perturbadoramente alta em relação ao Brasil, há que ter cuidado e olhar a situação pela perspectiva adequada. Em poucos anos esses países vão recuperar-se e é bom que estejamos preparados e atentos para dar continuidade ao trabalho de captação de turistas e eventos que vinha sendo feito até 2010. Costumo dizer que a crise nesses países é crise de rico, pois eles lutam nas ruas para não perder direitos que nós sequer sonhamos em conquistar por aqui! A Espanha, por exemplo, já apresentou leve crescimento no último trimestre. Não que isso signifique que a crise passou, mas é um sinal de que nem tudo está perdido e a roda da economia voltou a girar. Em economias mais maduras como as europeias isso pode significar a volta ao jogo muito antes do que pensávamos. Neste exato momento preparo-me para receber em Foz do Iguaçu um grupo de empresários espanhóis em busca de possibilidades de investimento. Deixar de apostar nos mercados europeus por conta da crise é uma temeridade, pois ainda recebemos milhares de turistas de lá e não devemos anular o trabalho de anos que foi feito para mostrar que o Brasil tem um portfólio de produtos muito além do carnaval e do futebol. Embora os asiáticos e russos estejam em alta, e o número deles que têm o Brasil como destino venha aumentando, seria um erro grave deixar de demarcar território em terras europeias. É para esse trabalho de recuperação que precisamos dos EBTs funcionando em sintonia com o setor privado e alinhados com estratégias de mercado vencedoras. Deixar essa tarefa a cargo de burocratas ou acadêmicos é um luxo que não podemos bancar. Vamos dar um voto de confiança ao projeto da EMBRATUR, esperando que, desta vez, tudo se acerte. Minha intenção com este texto é apenas a de provocar uma reflexão sobre qual seria o modelo mais adequado para que aproveitemos as oportunidades da ocorrência dos grandes eventos esportivos no país. A janela de oportunidade está em vias de fechar-se, e não vejo no horizonte um movimento capaz de amenizar a aridez da paisagem que nos cerca. Nossas esperanças no mercado internacional estão muito ligadas à excelência do trabalho que será realizado pelos EBTs, mas esperanças, como se sabe, são artigo de pouca utilidade num mercado competitivo e feroz. A grande questão é saber se o deslumbramento típico dos príncipes brasilienses será capaz de evitar a armadilha de fazer mais do mesmo. Enfim, é esperar para ver, mas é bom que os destinos que dependem do turista internacional, ou que tenham pretensões de disputá-lo, arregacem as mangas, busquem fontes sustentáveis para financiar suas ações de promoção, e não confiem nos ares que sopram do planalto central, pois eles podem estar, se não irremediavelmente poluídos, pelo menos algo viciados. E como se sabe ar viciado não faz nada bem aos pulmões, se é que me entendem! Se a esperança é a última que morre, é conveniente lembrar que ela não é nada sem a companhia de sua irmã gêmea, a decepção. Acreditem, nunca torci tanto para estar errado!