Virada Cultural x Violência

Sonho ainda em ver a Segurança como headliner da Virada Cultural, pois por enquanto ela vive nos bastidores, menosprezada e pouco estrelada.

A Virada Cultural é um projeto idealizado pela prefeitura de São Paulo, desde 2005, com o intuito de atrair a população da cidade, de todas as regiões, a ocupar os espaços públicos em sua territorialidade por meio da oferta gratuita, em sua maioria, do consumo em 24 horas ininterruptas de shows musicais, peças de teatros, oficinais culturais, entre outras formas de expressões artísticas.

Inspirado no festival francês Noite Branca, (Nuit blanche), que acontece todos os anos em Paris desde o ano de 2002, a Virada Cultural possibilita um fragmento de democratização, possibilitando o acesso a diversas formas de arte às mais distintas classes sociais, gerando maior socialização e até mesmo orgulho de pertencimento a uma cidade tão cosmopolita, diversa, com programações plurais para todas as tribos.

Porém, a grandeza do projeto traz consigo o grande desafio de promover toda a estratégica cultural alinhada com protocolos e planos de segurança para atender a um megaevento com atratividade de milhões de pessoas.

Ultimamente, alguns dos palcos mais concorridos da Virada Cultural tem sido ambiência, também, para atos de violência extrema, arrastões, roubos, furtos e brigas generalizadas.

Em 2016, as manchetes dos portais de comunicação deram destaque para as cenas de barbárie. Garrafas, pedras, balas de borracha e bombas de gás lacrimogêneo invadiram a programação da Virada Cultural no centro de SP na madrugada de sábado para domingo. Após um quebra-quebra entre a Polícia Militar e os fãs do grupo de rap Racionais MCs, na praça da Sé, a violência se alastrou para outras ruas e interrompeu pelo menos outros dois palcos próximos. As imagens ainda hoje reverberam… o cenário na praça da Sé era de pós-guerra. Carros amassados e com vidros trincados, orelhões arrancados, banheiros químicos depredados e grades no chão compunham esse cenário devastador. Isso sem falar em outros momentos, que até óbitos foram computados.

Agora, em 2022, com o lema a Virada do Pertencimento, o evento, que divulgou o expressivo número de mais de 300 atrações, bancadas pelo orçamento de R$ 20 milhões e estruturadas em oito palcos distribuídos pela cidade, teve a violência, mais uma vez, como protagonista.

Mesmo contando com um planeamento analítico em levar grandes atrações para palcos mais distantes, por causa da situação tensa na região central devido ao aumento dos roubos com a dispersão da Cracolândia, a Virada Cultural deste ano foi alvo de muitos atos violentos, que, sem dúvida alguma, maculou a imagem do evento.

Segundo o promotor do evento, a Secretaria Municipal de Cultural, "para todos os shows foram dimensionados policiamento, considerando as características e peculiaridades de cada uma das apresentações e regiões". Ainda acrescentando o discurso da Secretaria da Segurança, além das ações do policiamento a pé e motorizada, o evento contou com Bases de Policiamento Comunitário, instalações físicas, emprego do efetivo da Operação Sufoco nos pontos com maior concentração de público, além do apoio do Comando de Trânsito, Comando de Policiamento de Choque e Comando de Aviação.

Porém, na realidade, sobretudo no palco do Vale do Anhangabaú, todo o esquema de segurança montado foi ineficiente e muito abaixo da necessidade.

Os relatos desesperados são inúmeros em redes sociais e os participantes que lá estiveram transmitem episódios de puro caos.

A violência foi tamanha que ocasionou que o show de Kevinho, programado para às 23h de sábado, fosse paralisado antes do fim. O funkeiro afirmou que pessoas estavam "se machucando" e que a decisão era uma orientação da prefeitura. Durante o show dele, foi possível ver pessoas sendo levadas por bombeiros ao pronto-socorro, além de cenas de correria e de agressão.

Comerciantes da região, que abriram suas portas, com receio finalizaram os serviços e ficaram com medo de terem seus estabelecimentos invadidos e depredados.

O número de PMs neste ano é menor do que em 2019, quando foram destacados 2.300 agentes. Segundo a porta-voz, essa redução ocorre por causa redução de estimativa de público no evento pela prefeitura –de 5 milhões para 2 milhões.

Porém, a inteligência da segurança em eventos não é um mero cálculo matemático. Há necessidade de outros componentes não formatação de uma política e programa de segurança.

O foco desse evento não pode ser simplesmente a contratação de grandes nomes artísticos para as apresentações divulgadas na programação. A segurança deve prevalecer como a preocupação número 01. Investimentos na mesma, devem ser priorizados, ainda mais cientes do momento difícil e agressivo que passamos. Achar que naturalmente a irmandade irá se instalar e contar com a civilidade de todos os participantes, é desrespeitar noções básicas de preocupação com a integridade física e moral dos participantes.

Sonho ainda em ver a Segurança como headliner da Virada Cultural, pois por enquanto ela vive nos bastidores, menosprezada e pouco estrelada.

Já passou da hora da segurança em eventos ter sua posição elevada à categoria sine qua non. Pois como essa que vos escreve já disseminou em livro, Segurança em Eventos: Não dá pra Ficar Sem!