Lar Doce Lar

“É o homem mais feliz, seja ele rei ou camponês, aquele que encontra paz no seu lar” Johann Goethe

Às 19:30h Caio já estava no Aeroporto Santos Dumont, esperando pelo seu voo de volta para São Paulo, marcado para às 20horas. Ele saiu do Rio atordoado com o pedido de JK para que ele criasse uma Feira de Eletrodomésticos. Conseguiu lá mesmo no Aeroporto, um telefone público que funcionasse e ligou para o seu irmão José, atual dono da ALMAP, contando-lhe a respeito do “pedido” do Presidente, e já aproveitou para encomendar duas pesquisas: a primeira seria para saber o quanto as donas de casa sentiam necessidade de adquirirem eletrodomésticos, e a segunda, quais os eletrodomésticos que elas gostariam de ter em casa. José já estava acostumado com o estilo do seu irmão, que quando enfiava na cabeça a ideia de criar algo, não levava em conta as urgências do cotidiano de ninguém, exigindo que todos deixassem o que estavam fazendo, para dar prioridade àquilo que só ele enxergava no horizonte.

As pesquisas apontaram que as donas de casa da alta sociedade e da classe mÉdia alta, não demonstraram nenhum interesse pelos eletrodomésticos, pelo fato de terem muitos empregados que faziam os serviços domésticos, quanto as donas de casa da classe média, não conheciam a maioria dos eletrodomésticos que lhes foram apresentados, mas demonstraram interesse em conhecê-los. Enquanto, para as da classe média baixa, o preço dos eletrodomésticos, mesmo os dos preços mais básicos, os tornavam um sonho inalcançável. Um fato interessante foi que a maioria das entrevistadas, independentemente da classe social, fizeram questão de contar que conheciam pelo menos uma história em que ocorreu um acidente com o uso de algum eletrodoméstico, como o caso de uma enceradeira que pegou fogo, ou de um aspirador de pó que aspirou o rabo do gato, machucando seriamente o bichano, ou de um liquidificador que quando alguém ligou, o copo se desprendeu do corpo do aparelho e voou espatifando-se contra a parede, transformando em cacos de vidro o que antes tinha sido um sonho de consumo.

Caio se encarregou de buscar parcerias com a Arno, Philips, GE, Brastemp, Consul, Frigidaire, Daco, Bosh. Nesse aspecto teve todo o apoio do Presidente Juscelino Kubistchek que chamou essas empresas para uma reunião no Palácio do Catete para dizer-lhes quão importante seria essa Feira para o País.

A UD vinha de encontro à ideia e ao ideal da década de 1960, de que o lar deveria ser cuidadosamente planejado com muito bom gosto por que era nele, no casamento e nos filhos que as pessoas encontrariam a verdadeira fonte da felicidade. Os invejosos do Caio, aqueles que sempre torciam para que suas Feiras dessem errado comentavam: “onde já se viu uma coisa tão sem pé e nem cabeça, fazer as pessoas saírem de casa para ver geladeira, rádio, liquidificador e tudo o que existe numa loja e ainda por cima cobrar entrada?”.

A UD provou que como a FENIT ela também podia ser um sucesso. O número de visitantes que foi até o Ibirapuera para ver “geladeiras e liquidificadores” rondou a casa dos 500 mil. Milhares de pessoas ficaram deslumbradas com tanta beleza, onde os estandes lindíssimos foram capazes de transformar um punhado de eletrodomésticos em verdadeiros objetos de desejo. Outros aparelhos moderníssimos como rádios de pilhas, ventiladores portáteis, enceradeiras com três escovas, som estereofônico, TV com controle remoto ligado apenas por um fio na televisão, forno com visor panorâmico e com iluminação dentro, impressionou todo mundo.

Caio batizou essa Feira de Feira de Utilidades Domésticas, UD, e criou um espaço de varejo no fundo do Pavilhão, e o chamou de Cozinha Maluca. Era na verdade um tipo de mercado persa, com os vendedores anunciando ao mesmo tempo e aos gritos os seus produtos enquanto faziam demonstrações ao publico das suas novidades. As estrelas da I Cozinha Maluca foram uma “estraladeira” que conseguia fritar até 5 ovos ao mesmo tempo; um descaroçador de azeitonas, um coador de tela de náilon, que não deformava e resistia a temperatura até 130 graus centigrados, uma churrasqueira que podia ser acoplada no fogão e um aparelho que estourava pipocas sem precisar de óleo.

Em 1960, começava engatinhar o gosto das donas de casa por aulas de culinária. Esses cursos nunca tiveram espaço antes porque a mesa dos brasileiros, independentemente da classe social era muito pobre em variedade, até porque as receitas eram típicas de cada região, passadas de mães para filhas, sem modificar um dente de alho, de gerações em gerações. Os ingredientes eram medidos a olho, através da experiência, tanto assim que as primeiras balanças para pesar os ingredientes expostas na UD, encalharam aos montes causando um enorme prejuízo aos seus fabricantes. Na mesa do paulista compareciam todos os dias o arroz(Brejeiro) branquinho e soltinho, orgulho das donas de casa, o feijão e a carne de boi, porque além de ser a queridinha do paladar de todos era muito barata. O frango, este já era considerado um prato mais “sofisticado”, e por isso era escolhido para ser servido aos domingos, acompanhado com arroz e batatas. O peru, esse nem se fala, era comida de Natal. Mas em compensação, o bacalhau salgado importado de Portugal aos montes, vendido barato nas feiras livres, era popular e se transformava em bolinhos, pasteis, tortas, frito e cozido. Fora isso, não existia nenhuma novidade.

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