Caio jamais desligou seus motores, seu ideal era conquistar o mundo.

“Comece fazendo o que é necessário, depois o que é possível, e de repente você estará fazendo o impossível” São Francisco de Assis

Queridos leitores, vocês não vão acreditar quão alto o Caio levantava voo, atingindo a estratosfera com suas ideias sensacionais, e mesmo quando aterrissava na Alcantara, nunca desligava seus motores. A bem da verdade é que a maioria de suas inovações e imensa criatividade, mesmo aquelas que todos achavam impossíveis de serem realizadas ele conseguiu realizar uma a uma. Um exemplo desse sonhador bem-sucedido aconteceu em 1963. Num belo dia, saiu uma noticia no jornal, que deixou a todos perplexos. O texto dizia que apesar do Caio ser um homem realizado nos negócios, o seu grande sonho ainda não tinha sido realizado, mas que o seria brevemente. A notícia afirmava que há quatro anos Caio estava idealizando uma Feira Internacional da Industria Têxtil, que seria levada para a maioria dos países do mundo, através de um navio. Sim, é isso mesmo que vocês leram, Caio queria fazer a FENIT num navio e percorrer o mundo, parando em todos os portos do planeta terra.

O jornalista, autor do artigo, relatava os detalhes do projeto, dizendo que o Caio já tinha conversado com a Marinha Brasileira, e já tinha escolhido o navio, tinha contratado um contador e os primeiros desenhos do arquiteto já estavam guardados na sua “gaveta secreta”. O navio seria reformado para que todos os andares fossem da 1ª classe. A decoração tinha que ser luxuosa, mas 100% brasileira e nada de cacho de banana ou papagaio, segundo determinação do próprio Caio. Para surpresa do leitor, os detalhes não paravam por aí. O articulista cuidadoso fez questão de divulgar que algumas reuniões já tinham sido feitas com o arquiteto, mas que o Caio não tinha permitido que o nome do profissional fosse divulgado. Mas o projeto do navio já estava pronto para fazer uma viagem de “circunavegação”, e o artigo terminava explicando que o navio teria salas de cinema, restaurantes, áreas de lazer, suítes lindamente e brasileiramente decoradas.

Essa notícia já tinha sido veiculada pela Folha de São Paulo, em 1960, mas Caio tinha encontrado na época tantos obstáculos, que postergou o projeto, mas nunca desistiu dele, só o tinha jogado para frente. Agora, dizia o jornalista, o projeto ganhava um novo sabor, o da vitória, em virtude de o ministro da Fazenda, Carvalho Pinto, ter garantido o apoio do governo brasileiro, principalmente por se tratar de uma iniciativa pioneira. Completando o artigo, dizia o jornalista: “trata-se de um investimento de mais de um bilhão de cruzeiros”.

A partir das 8 horas da manhã, no dia em que esse artigo foi publicado, os telefones da Alcântara não pararam de tocar. Amigos, conhecidos, familiares, todos querendo falar com o Caio. Uns felizes, outros chocados, mas a maioria magoados pelo fato dele jamais ter sequer mencionado tal façanha. Essa era uma atitude típica do Caio, ele escutava todo mundo, dava conselhos, ajudava, mas ninguém sequer sabia o que ele pensava sobre nenhum assunto, Caio jamais compartilhava com quem quer fosse sua vida, sonhos, tristezas, alegrias, sentimentos e principalmente projetos.

Para sua surpresa, Caio recebeu apoio de muitos industriais que gostariam de expor nessa Feira sobre as ondas. Quando as operações burocráticas começaram, os advogados e contadores esbarraram numa montanha de complicações devido as legislações dos países por onde Caio queria passar, novamente inviabilizando o projeto. Mas, para seu consolo, pensou com os seus botões, que o mais difícil ele tinha conseguido, que era o apoio do governo. Mas esse projeto fez residência na sua cabeça, ali morando para sempre.

O trabalho de catequese feito pela equipe da Alcantara junto aos expositores começava mostrar seus frutos, atingindo seu ápice na VI FENIT. Convencidos ou convertidos, os expositores contrataram artistas plásticos e cenógrafos para fazer seus estandes, e nos corredores da FENIT foram aparecendo sofisticados labirintos, palcos belíssimos, lindas passarelas, charmosas butiques, e aqui e acolá apresentações artísticas, embelezando e conferindo glamour à FENIT. Nesse ano de 1963, Caio trouxe Mary Grant, Frederico Forquet e Bill Blass como costureiros internacionais “convidados”. Empresas como Pull Sports, América Fabril, Le Mazelle e Paramount Têxtil, entre outras, fizeram questão de concorrer em brilho com a Rhodia promovendo eventos importantes na Feira. Mas apesar de todos os esforços dos concorrentes, a partir dessa VI FENIT, a Rhodia passou a ser a Primeira Dama da Feira, e a FENIT se colocou na plataforma de lançamento para no ano seguinte, se consolidar como a maior Feira Têxtil da América Latina. Seu crescimento não só podia ser medido pelo numero crescente de expositores, mas pela acirrada competição que passou a existir entre eles. Os expositores brigavam a cada FENIT para triplicar o espaço que os seus estandes ocuparam na FENIT anterior, pois achavam que não adiantava apenas participar da Feira, tinham que se sobressair do conjunto a todo custo.

Lívio preparou um belíssimo espetáculo para essa VI FENIT, um desfile-show para inaugurar o novo auditório da Rhodia: o “Brazilian Look”. Tinha tanta gente famosa que quem assistiu o desfile ficou embasbacado com sua beleza. As estampas dos tecidos foram criadas por artistas plásticos, como Alfredo Volpi, Aldemir Martins, Carlos Vergara, Manabu Mabe, Hercules Barsotti e Willys de Castro. O objetivo tanto do Lívio como do Caio, era gerar propaganda através dos desfiles, e sem dúvida ajudar o crescimento da Indústria Têxtil, criando uma moda “nacional”, com elementos que reportassem a arte e cultura brasileiras, presentes não só nas roupas confeccionadas por costureiros brasileiros, como nas cores dos tecidos, nos motivos das estampas, nos temas dos desfiles, nas músicas e nos espetáculos como um todo. O “Brazilian Look” teve um sucesso estrondoso, e em todas as apresentações Sergio Mendes foi ovacionado de pé. Depois das apresentações na FENIT o desfile-show percorreu o Brasil e também alguns países da Europa fazendo o mesmo sucesso.

Terminada a FENIT o que se escutava por toda parte era: “Não é possível, alguém deve conhecer alguém que ajudou a fazer o show da Rhodia na FENIT. Alguém deve saber onde eu posso comprar aquele tecido com os desenhos do Lula Cardoso Ayres, do Aldemir Martins ou do Manabu Mabe. Não é possível que eles estejam fazendo um show desse tamanho que não seja para vender esses tecidos. Diziam outros, eu não acredito que eles fariam isso à toa. Quando terminou essa FENIT, Cyro del Nero, contou para o Caio, Lívio, Licínio, e Alex Periscinoto, as histórias que ele tinha escutado. Caio e Lívio ficaram eufóricos, finalmente tinham conseguido que os tecidos, com suas cores, desenhos e beleza se tornassem inacessíveis às mulheres, e que elas só poderiam levar para casa o desejo de possuí-los.

Mas administrar os egos de tanto artista importante era um capítulo a parte. A rivalidade entre os costureiros brasileiros e internacionais, era de soltar faísca a ponto de quase queimar quem estivesse por perto. Clodovil ficava uma fera por qualquer coisa que acontecia, porque se corroía por dentro de tanto ciúmes e dor de cotovelo e sempre tentava arrancar da organização da Feira, quanto o Caio pagava para cada costureiro internacional vir desfilar na FENIT. Já Dener, não. Caio o achava vivo, inteligente e esperto, tanto que numa FENIT, na qual ele teria que apresentar seu desfile logo após o do Pierre Cardin, sem que ninguém notasse, foi até o camarim onde estavam pendurados os vestidos do costureiro, copiou os modelos com os olhos, correu para o seu Atelier e literalmente da noite para o dia mudou tudo e mostrou uma coleção brasileira, muito parecida com a do renomado e internacional Cardin. O sucesso foi imediato.

Para a VII FENIT, um dia Lívio apareceu na casa do Caio bem cedinho, sendo o Lívio, Caio não se aborreceu com esse “intruso” no seu café da manhã, porque o Lívio sempre trazia novidades, Lívio sentou-se do seu lado e sem nenhuma introdução, tomou de assalto o sossego e a paz que o Caio estava desfrutando: “Caio, tive uma ideia sensacional e preciso da sua autorização”. “Como você sabe, o “Brazilian Style” é um show que aborda as riquezas brasileiras, então imaginei que a gente poderia trazer um boto cor de rosa, que só as pessoas que vivem no Amazonas conhecem. É só isso que eu preciso de você hoje, depois vou me embora, não te incomodo mais e deixo você descansar sossegado”.

Caio sorriu com o seu sorriso “sorridente” que mostrava todos os dentes. “Lívio você é o melhor parceiro que eu poderia ter na vida, essas suas loucuras, excentricidades e ousadia acho que só podem vir de mim ou de você, e isso não me deixa mais me sentir sozinho na vida, afirmou Caio quase orgulhoso”. Quem deu todas as instruções do que precisava ser feito com o boto cor de rosa foi o Mario Autuori, diretor do Jardim Zoológico de São Paulo. Afinal Caio mandou buscar um boto, que foi pescado no rio Amazonas. O boto ficou no auditório dos desfiles, num fosso feito especialmente para ele, até o ultimo desfile. Mas morreu no dia seguinte do fim da Feira. Que segundo o Caio, “foi um boto muito responsável, cumpriu com as suas obrigações”.

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