O Coletivo que Precisa ser Pensado no Individual

Festa de aniversário surpresa em escritório norte americano gera indenização de R$ 2,1 milhões

É notório que a atividade de eventos é um poderoso veículo de comunicação dirigida, disponível para o atendimento às necessidades de diferentes grupos de interesse.

Na abordagem do processo comunicacional interno, os eventos – em diversas tipologias – atendem a premissa de uma maior conexão e transmissão de mensagens relativas as diretrizes e estratégias da organização.

A maioria dos eventos internos de uma instituição apresentam o zelo de buscar sempre uma plena equidade entre todos para não gerar percepções de injustiças ou tratativas que sejam consideradas exclusivas para uns e não para outros.

Porém, é sempre importante contestar as ideias já lavradas e ditas como plenas, já que os eventos também permitem uma customização conforme as próprias demandas corporativas.

Um recente caso nos Estados Unidos, em Kentucky, ratificou tal pensamento, exigindo de todos nós profissionais, que trabalham na organização de acontecimentos especiais, lapidemos ainda mais nossa sensibilidade e identificação real do perfil dos envolvidos.

A história começa justamente com uma festa de comemoração surpresa de aniversário de um funcionário, como já era tradicional na empresa. Porém ciente desse rito já consagrado pela organização, o colaborador Kevin Berling avisou previamente ao seu chefe que um evento desse provocaria estresse e ansiedade, e que poderia, trazer à tona memórias de infância nada felizes, inclusive, sendo gatilho para um episódio de síndrome do pânico.

Apesar do pedido de Berling, a empresa, Gravity Diagnostics, fez arbitrariamente uma festa surpresa para ele em agosto de 2019, provocando um ataque de pânico. Ele rapidamente saiu da festa e terminou seu almoço no seu carro.

No dia seguinte, Kevin Berling declarou que foi "confrontado e criticado" em uma convocação empresarial quando foi acusado de "acabar com a alegria dos colegas de trabalho" e "de ser um maricas".

O clima da reunião, tenso, provocou um segundo ataque de pânico e ele se ausentou da corporação nos dias seguintes, ficando em casa para se recuperar.

Mediante tais fatos, o funcionário decidiu entrar na justiça contra a empresa, após ser demitido pela própria, logo depois, alegando questões de segurança no trabalho.

Berling entrou com o processo dizendo que a empresa o discriminou por causa de uma deficiência e que foi alvo de uma injusta retaliação por ter feito o pedido.

Após um julgamento de dois dias no final de março, o júri concedeu a Berling US$ 450 mil, incluindo US$ 300 mil por danos emocionais e US$ 150 mil em salários perdidos.

O julgamento fez valer o conhecimento do fato que segundo dados do grupo National Alliance on Mental Illness mais de 40 milhões de americanos - quase 20% da população - sofrem de transtornos de ansiedade. E que isso não pode ser um ato discriminatório, sobretudo se existirem laudos.

Contudo, há uma outra lição a ser assimilada... por mais que os funcionários façam parte de uma célula integradora, é preciso respeitar as opiniões e particularidades de cada um.

Faz pouco tempo e tínhamos as convenções corporativas envolvidas em exercícios de sobrevivência e simulações de verdadeiras batalhas e extremismo competitivo.

Os resultados nem sempre eram os mais aprazíveis e de excelência, sobretudo para os times que não obtinham resultados exitosos, sempre marcando os “culpados” pelos fracassos. O que ocasionava o efeito reverso, mas essas ações foram vendidas como as mais top do momento e o mercado aderiu ao modismo frenético.

A diversidade que existe e é até explorada como princípio valorativo não exclui a sensibilidade de respeitar o individualismo de cada um. As empresas refletem seu coletivo, mas devem manter intacta a integridade de cada um, assim como seu bem estar, estando sempre disponível para acolher as diferenças, anseios e especificidades de cada personalidade, afinal não há nada mais injusto que tratar todos da mesma forma... já que somos singulares em ambientes plurais e isso precisa sempre ser considerado.

Até porque uma simples festa de aniversário para uns pode ser algo bem bacana... para outros nem tanto... e para empresa pode gerar perdas financeiras e até mesmo abalar sua reputação social.

Antes de soprar as velas é bom analisar todas as circunstâncias, pois a chama pode perdurar mais que o imaginado.